terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Criminalização dos movimentos sociais no Brasil: suposição ou realidade?


O nosso País é mesmo uma nação sui generis. Quase do tamanho da Europa, possui 47% do território sul americano. Guarda em seus domínios 20% de toda a biodiversidade do planeta, tem todos os tipos de clima e de solo, é dono de uma riqueza cultural e de uma miscigenação sem precedentes.

Sobre esta terra, Caminha teria escrito em 1500: “Nela, em se plantando, tudo dá”. De lá para cá, foi cantada e recantada desde a arte do “Brasileirinho” ao ufanismo militarista de “Este é um país que vai pra frente”. Inúmeras vezes rotulado de “o país do futuro”, belo em vários aspectos, o Brasil se torna feio quando observado sob o paradigma político.

As autoridades públicas nunca deram muita bola para os problemas sociais dessa gente “que não vive, apenas aguenta”. Na dúvida, basta lançar olhos sobre a favelização das cidades, o analfabetismo e as diferenças regionais e sociais. Em suma, o Brasil é um país rico cheio de gente pobre.

Topado de riquezas, não as distribui a todos por não ter uma política ampla de oportunidades; ratifica sua opção pelo atraso social; não exige o pleno cumprimento das garantias constitucionais e leis trabalhistas; não oferece moradia e terra para quem mais precisa. Só resta aos excluídos a alternativa de questionar o sistema; é quando entram em cena os movimentos sociais, pelos quais uma boa fatia da elite política e empresarial nutre visceral aversão. Os trabalhadores organizados são vistos com certa neurose, como no regime militar apeado do poder em 1985, e ainda inspirador de muita gente endinheirada.

Persiste certo saudosismo da época em que trabalhador não questionava patrão nem governo e os sindicatos e associações eram clandestinos, “ilegais”; os ativistas, “agitadores subversivos” e perigosos. No Brasil atual parece subsistir a tendência de se rotular e resolver os conflitos de hoje com as velhas fórmulas do pós 1964 travestidas de uma roupagem mais sutil. Sob a mal disfarçada ditadura do mais forte, a criminalização da causa operária queima feito fogo de monturo.

De tanto ser irradiada, essa cultura de aversão aos movimentos organizados atinge as camadas mais pobres. Já vi muita gente que não tem um palmo de chão criticar duramente o movimento sem-terra, assim como trabalhadores pessimamente remunerados desdenharem o direito de greve. A fobia é geral. Ao primeiro sinal de manifestação, muitos empresários e gestores públicos, sem se preocupar em negociar com os trabalhadores, acorrem aos tribunais pleiteando a “ilegalidade” das greves, principalmente se desencadeadas por servidores públicos do Poder Executivo.

O mais curioso: os empresários e o governo quase nunca cumprem a legislação que beneficia o trabalhador, mas se utilizam amplamente da lei para fulminar greves, que são um direito constitucional. Outra questão grave é a perseguição – velada ou ostensiva – aos representantes de classe, que são taxados, punidos, demitidos ou simplesmente remanejados para setores por puro castigo. Há exceções, mas são mínimas. O Estado tem feito vista grossa dessa realidade, pondo, indiretamente, mais lenha na fogueira.

Há uma enorme distância entre limitar o direito de manifestação e criminalizá-lo. É um absurdo punir, taxar ou banir um trabalhador porque não aceita ser explorado, ou porque alguém ainda acha justa e normal a exploração do trabalho alheio.

Na época das senzalas, os escravocratas achavam a escravidão “justa e real”. Em nome de tal “justiça” e “realidade”, os negros não “enquadrados” no regime eram tratados como os piores criminosos e castigados com todo rigor. O País chega à era da informática permeado de ares senhoriais. No Brasil contemporâneo muitos trabalhadores perderam a vida pelo simples fato de acionar os patrões na Justiça. Talvez por isso os Titãs perguntassem “Que país é esse?” Alguém se habilita a responder?


José Heleno Santos

Fonte: O jornal-Alagoas


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